Sunday, July 22, 2012

Carlos "o mini-anão" (1)

    Ontem estava sentado no cimo da colina a olhar para as "gritarias" que se passavam dentro da assembleia das "conversetas" no palácio da rainha de copas.
    Enquanto um dos ministros da rainha falava, uns arruaceiros, desculpem... corrijo: uns professores... "esses" arruaceiros, mostravam cartazes negros que chumbavam das galerias as boas intenções da "converseta" real.
    Logo de pronto umas cartas do exército da rainha de copas, entraram em acção, mas "comicamente" insufladas, pelo tempo que passam encostadas às portas do palácio, sujeitas a muitas correntes de ar. Mesmo assim, não deixaram de mostrar prontidão e cara de "rigor" com gestos severos, executando as ordens de "evacuar" o atentado á ordem. Talvez, penso eu, à ordem do próprio sítio, pois estes arruaceiros queriam-se expressar-se num sitio que foi estabelecido por ordem da rainha gorda (como o nome indica!), só para "conversetas".
    Pergunto-me se não temos de ponderar o valor dos professores, "esses arruaceiros", agora com a opção de uma educação por equivalências (é a segunda vez que uso esta piada!!!).
    Tudo acabou, mas não sem antes, o ministro gritar varias vezes a
 traição, (quando me parecia, que queria mesmo gritar era: "raios partam, quem os quis educados.").

    O calor aperta por aqui e "aquilo" fartou-me, saltei para cima da mota.     Apetecia-me andar um pouco, fintar alguns carros, meter-me por ruas e ruelas.
    E foi numa dessas ruelas que encontrei, uma vez mais, o Carlos, o meu amigo mini-anão, sentado nas escadas à porta de casa.
    Parei a mota e fiz-lhe sinal. Num instante estava sentado ao lado dele que continuava de semblante baixo.
  
    - Estão pá o que se passa?
    - Estou lixado pá!
  
    Percebi que era de dinheiro e trabalho e, não os vou maçar com a conversa inteira de um coelho e um mini anão em wonderland. O Carlos contou-me que tem mandado uma serie de curriculum para entrevistas e estava a desesperar não o chamarem. Quando por fim houve a primeira entrevista, pôs-se todo bonito, imprimiu o seu curriculum num papel especial que lá tinha em casa, e levou consigo o seu "fiel" escadote, para o conseguirem olhar de frente e não de cima.

    - "... Cheguei lá com o meu melhor fato e sapatinhos engraxados, o " escadote" a reluzir. Entrei montei o escadote e apresentei-me, até sorri... perguntaram-me e eu respondi a tudo, depois perguntaram-me do escadote, e eu expliquei que se adaptava mesmo a mim, que me fazia ver as coisas de outra maneira, com mais conhecimento do que estar lá em baixo no chão, que tinha sido uma nova oportunidade...
    Não me deixaram acabar, disseram logo que gostavam muito da minha vontade e do meu carácter, do conhecimento que mostro mas que só me pagavam a mim e não me pagavam o "escadote".
    Eu insisti, mostrei que do chão ninguém me vê, que não chego a secretária e que era um investimento. Eles sempre sorridentes aconselharam-me a não desistir, mas que de momento lamentavam não puder "ficar" comigo.

    - Dia tramado! - Disse
    - Mas não acabou! -cortando a minha frase. - Dali segui para o fundo "do" desemprego e decidi não levar o escadote, tentar a minha sorte para um trabalho para a minha medida "normal".
    Quando cheguei, a fila subia e descia a rua dez vezes!... e após essa fila interminável que avançava a passos mais pequenos que os meus, conseguias tirar a senha, e sentavas-te numa sala pequena com um ecrã gigante que anunciava os números a chamar. Uma espera interminável, um tumulto para a paciência e para a consciência.
    Pior!!! Cada número ao passar, emitia um barulho de besouro, que nos marcava irritantemente como se fossemos punidos daquela espera e por estar ali.
    A sala era enorme e as pessoas ocupavam todas as cadeiras, e cantos onde se pudessem encostar, dormitavam com pêndulos de pescoço e pairava no ar um cheiro a impaciência.
    Quando chegou a minha vez, já estava meio a dormitar, mas por instinto, levantei-me rapidamente. Perdi ali uns segundos, mas em passo rápido embalei no atravessar da sala.
    Notei que a senhora do balcão para onde me dirigia estava a ficar nervosa. Olhava para a sala e não via ninguém. Eu apressava o passo antes de ela desistir de procurar e chamar outro número num outro besouro que me mandava para o fim da fila!.
    E consegui!!!! Cheguei ao balcão mesmo no momento antes de ela carregar naquele maldito botão, gritei com a senha na mão. Vejo que a senhora parou e olhou, mas eu não tinha o meu escadote e ela não me via de trás do alto balcão. E por mais que eu saltasse, os seus olhos olhavam em frente procurando simplesmente o "seguinte"...
    Pensando bem! até esperou "momentos de mais", mas o maldito dedo carregou no maldito botão, e logo apareceu um personagem qualquer que se apressou a me empurrar "sem querer" para o lado, ignorando o meu "barafustar", como se o assunto que o leva-se ali fosse muito mais importante que o meu.
    Fiquei furioso, e dei-lhe três ou quatro pontapés bem valentes nos tornozelos, mas logo fui parado por um bando de segurança, amarelos e castanhos ( esses já me viram bem!!), que me arrastaram até á porta, deixando aquele idiota, agarrado ao balcão, com os tornozelos inchados e um ar indignado.
    Tentei manter a calma e percebi que ali já não me safava, por isso, arranquei em direcção a segurança soçial, a minha última hipótese para hoje...
    Apressei-me e "galguei" o passo, fintando as pernas pelo caminho durante 24 quarteirões. Quando entrei embalado pela porta da frente, dirigi-me de imediato (convicto da minha determinação!), á maquina que nos dá o número de atendimento.
    Os últimos passos pelo corredor, que me levavam para conseguir aquele bocado de papel com um número, foram "ajudados" por uma vontade que se restaurou, na esperança talvez de uma... solução.
    A frente da máquina encontrava-se tapada com uma folha A4, presa com fita-cola de secretária, que dizia: "limite de senhas diário ultrapassado."
    ....

    Neste momento, o Carlos calou-se. Acho que não é preciso contar o que passou de seguida. Ele ficou a relembrar o que se seguiu, com um ar "desgastado", e eu perdi-me a imaginar (inevitavelmente com um ar cómico) um mini-anão, atacado pela raiva, espumando pela boca que proferia todos os insultos possíveis e imaginários para o ar, contra todos mas na realidade contra ninguém. Isto tudo enquanto era novamente arrastado para o exterior, desta vez por um bando de segurança pretos e brancos, que suavam para segurar o "espernear" das suas pernas "pequeninas".

    Enquanto me perdia neste "cartoon" que desenhava nos pensamentos, o sol "caia" ali á nossa frente, e o calor dos últimos raios na cara, fez-nos a ambos, "fitar" aquela vista que ia desenhando sombras de prédios e arvores a negro, no chão.
    Saquei de um cigarro já enrolado e acendi-o, travei duas ou três vezes e deixei o fumo sair pelas narinas, que ardiam á passagem deste... Passei o cigarro ao Carlos "mini-anão", que o agarrou e depois de uma valente bafo, sem nunca tirar os olhos do espectáculo que o sol desenhava disse:

    - " ... Bom pelo menos isto ainda é de borla !!!!"

    Sorri e pensei: " Ya!!! pelo menos, "isto" ainda é de borla, e qualquer dia, lixamos "isto" de tal maneira, que temos de viver em buracos e nem "isto" podemos ver..."
  
    Estiquei a mão, para voltar a fumar do meu cigarro, mas o cabrão do mini-anão já tinha data conta dele. Afinal não foi só o pôr-do-sol que foi de borla.
  


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