Thursday, May 31, 2012

Feio Artwork

A primeira prenda de um amigo artista. Dizia no envelope: " from the bottom of my heart" percebi que não era coisa boa!!!. 


Vadiar por lisboa

    Atravessando Lisboa numa noite quente (daquelas primeiras de primavera, em que o corpo ainda não está habituado ao conforto do tempo) divirto-me a ouvir o ecoar de uma cidade adormecida.
    As avenidas prolongam-se com um contorno de luzes públicas, cortadas por semáforos que trabalham devagar, despromovidos daquela irritante atitude, que muitas vezes parecem ter, ao gozar com a nossa paciência durante o dia.
    As ruas, essas, são estreitas e irregulares, fáceis de nos fazer perder, no seu rendilhado, que se vai descobrindo de uma maneira anárquica, sem grande sentido de organização urbana.
    Isto tudo, adornado pela personalidade dos becos, das praças, dos jardins velhos, e do rio, que faz ondular a cidade nas sombras da sua maré. Tantas e tantas características que se destacam mais, quando um sitio adormece.
    Como em outras cidades, gostava de me puder sentar num sítio alto e olhar Lisboa de cima, como conseguimos olhar NewYork ou Paris. Perder tempo a ver estas ruas" tecidas" com uma "imperfeição" perfeita que criou um verdadeiro labirinto, sobre as colinas povoadas numa quase displicência exigida pela paz do Tejo.
    Nesta cidade, "vadiar" ganha um sentido quase romântico, como uma atitude intrínseca num cenário meio louco. Ruas estreitas, avenidas pombalinas, zonas portuárias e os "fantásticos" quintais (que sobrevivem e fazem sobreviver!). Bairros velhos e bairros novos, tudo se ergue ao nosso redor sem uma ordem aparente.
    O ar quente que me faz respirar fundo, faz também com que a paragem em cada cruzamento, seja mais um pensamento que se fecha, para seguir numa outra qualquer rua de raciocínio, nunca muito certo do rumo que ela vai tomar.
    Aqui não se anda de norte para sul, ou de este para oeste, aqui os pontos cardeais transformam-se em atalhos, em descidas e subidas e em rotundas que nos embalam num movimento circular, para nos cuspir numa qualquer direcção. 
    Olho, os outros que "vadiam" por aqui também, com uma desconfiança curiosa e sigo caminho, sem perder tempo a questionar as suas razões, pois a noite tira o melhor e o pior de um homem, e eu, sei bem disso!!!
    Mas quando nos deslocamos, sem destino, sem propósito, perdemos o ritmo e ignoramos a influência da lua no nosso lado mais irracional. Livremente, limitamo-nos a "cruzar", numa solidão confortável, que ajuda o pensamento.
    Sorriu com os contrastes da cidade, zona velhas, zonas novas, zonas ricas, zonas pobres, tudo aberto num leque de opções que parecem cada vez mais desiguais e que nem mesmo o manto da noite consegue disfarçar.
    O abandono de certas paredes pintadas por tintas garridas e tags pouco originais, é espelhado nas fachadas de vidro, de prédios semi altos com passeios direitos de pedra branca.
    Ao contrário das cidades modernas, aqui tudo se mistura, tudo parece que foi feito, sem ser verdadeiramente planeado, e é esse contraste urbano que se vai misturando ainda pela maioria dos sítios numa mentalidade rebelde. O bonito e o feio, o rico e o pobre, o construído e o baldio, tocam-se com a distância de uma rua.
    O que não esconde também uma certa crueldade e diminui o espaço, dando uma sensação muito mais pequena, de dimensão e faz com que nada por aqui seja "direito", um pouco como a própria mentalidade lisboeta, tudo é encurtado por atalhos e cortado por sentidos proibidos, e isso, torna Lisboa numa cidade de mentalidade incerta, uma cidade onde o alcatrão acaba e inesperadamente as pedras da calçada nos abanam os sentidos, e nos despertam a procurar outros caminhos.
    Para quem já viajou por outras cidades percebe o romantismo desta anarquia urbana, que teima em evoluir, com o peso de uma história, que se acumulou sem uma mentalidade "grandiosa", e que se vai arrumando, agora, nos sítios por onde pode.
    Lembro-me de outras cidades antigas e faço um contraste que não deixa de ser um puro exercício romântico. Claro que não chegam ruas e avenidas, prédios e cafés para traçar uma mentalidade colectiva, mas sem duvida que esta loucura urbana, dá a Lisboa um sentimento único, uma nostalgia que teima ainda num tom "de alma antiga", e que me permite (a mim e a tantos outros), ir "vadiando" (com ou sem propósito) por aqui...  Rasgando pensamentos, descobrindo o que já conhecemos, perdidos por uma característica cada vez mais única, de uma cidade que... ainda dorme!!

    Este blog é um fruto de um "corporativismo" de vários amigos, provavelmente já fartos de mails meus, no meio da noite, a convida-los para viagens a sítios "esquisitos". Viagens pelas palavras que vou "escrevinhando", e onde vou vadiando em pensamentos, deixando um bocado de mim, umas vezes "sobre tudo" e outras simplesmente "sobre nada".
    Um estilo de vida, que como qualquer outro, tem o seu preço definido na personalidade, e que se traduz muitas vezes em frases, textos, imagens, musicas. Uma loucura em geral que define cada um de nós como seres únicos, inseridos ( ou renegando rebeldemente!) um determinado contexto social e temporal ao qual não podemos escapar.
     Mas em relação ao blog, como qualquer coisa, isto só tem piada enquanto não for uma obrigação.
     Por isso, ao principio podem não estar habituados á velocidade e as viagens tendem em ficar atribuladas (principalmente as feitas em harleys antigas !!!), mas tentem respirar fundo, ponham os óculos de sol (que por aqui, ainda temos o luxo de os usar o ano quase todo!!) que as cores vão-se simplificando.
    Acabaremos todos, lá em cima, no jardim do palácio da Rainha de copas, a olhar o ghetto cá em baixo, com um sol quente de fim de tarde. Gozando (de borla!) um pouco da liberdade, que os tempos modernos (cobram!) e chamam qualidade de vida.


    Bom!!!

    "Lady´s and gentleman´s start your engines... 3 , 2 , 2 , 1 green light in the quarter mile".